Tratado de Petrópolis

Brasil / Bolívia ( 17.novembro.1903 )


A Republica dos Estados Unidos do brasil e a Republica da Bolívia, animadas do desejo de consolidar para sempre a sua antiga amisade, removendo motivos de ulterior desavença, e querendo ao mesmo tempo facilitar o desenvolvimento das suas relações de commercio e boa visinhança, convieram em celebrar um Tratado de Permuta de Territorios e outras compensações, de conformidade com a estipulação contida no art. 5º do Tratado de Amisade, Limites, Navegação e Commercio de 27 de março de 1867.

E, para esse fim, nomearam plenipotenciarios, a saber:

O Presidente da Republica dos Estados Unidos dp Brazil, os Senhores José Maria da Silva Paranhos do Rio Branco, Ministro de Estado das Relações Exteriores, e Joaquim Francisco de Assis Brasil, Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario nos Estados Unidos da America; e

O Presidente da Republica da Bolivia, os Senhores Fernando E. Guachalla, Enviado Extraordinario e Ministro Plenipotenciario em missão especial no Brasil e Senador da Republica, e Claudio Pinilla, Enviado Extraordinario e Ministro plenipotenciario no Brasil, nomeado Ministro das Relações Exteriores da Bolivia;

Os quaes, depois de haverem trocado os seus plenos poderes, que acharam em boa e devida forma, concordaram nos artigos seguintes:

Artigo I

A fronteira entre a Republica nos Estados Unidos do Brasil e a Bolivia ficará assim estabelecida:

Parágrafo 1º) Partindo da latitude sul de 20º 08' 35" em frente ao desaguadouro da Bahia Negra, no Rio Paraguay, subirá por este rio até um ponto na margem direita distante nove kilometros, em linha recta, do Forte de Coimbra, isto é, aproximadamente em 19º 58' 05" de latitude e 14º 39' 14" de longitude oeste do observatorio do Rio de Janeiro (57º 47' 40" oeste de Greenwich), segundo o mappa da fronteira levantado pela Commissão Mixta de Limites, de 1875; E continuará desse ponto, na margem direita do Paraguay, por uma linha geodesica que irá encontrar outro ponto a quatro kilometros, no rumo verdadeiro de 27º 01' 22" nordeste do chamado " Marco do Fundo da Bahia Negra", sendo a distancia de quatro kilometros medida rigorosamente sobre a fronteira actual, de sorte que esse ponto deverá estar, mais ou menos, em 19º 45' 36",6 de latitude e 14º 55' 46".7 de longitude oeste do Rio de Janeiro (58º 04' 12".7 oeste de Greenwich). Dahi seguirá no mesmo rumo determinado pela Commissão Mixta de 1875, até 19º 02' de latitude e, depois, para leste, por este parallelo, até o Arroio Conceição, que descerá até a sua bocca na margem meridional do desaguadouro da Lagoa de Caceres, tambem chamado Rio Tamengos. Subirá pelo desaguadouro até o meridiano que corta a Ponta do Tamarindeiro e depois para o norte, pelo meridiano do Tamarindeiro, até 18º 54' de latitude, continuando por este parallelo para oeste até encontrar a fronteira actual.

Parágrafo 2º) Do ponto de intersecção do parallelo de 18º 54' com a linha recta que forma a fronteira actual seguirá, no mesmo rumo que hoje, até 18º 14' de latitude e por este parallelo irá encontrar a leste o desaguadouro da Lagoa Mandioré, pelo qual subirá, atravessando a lagoa em linha recta até o ponto, na linha antiga de fronteira, equidistante dos dois marcos actuaes, e depois, por essa linha antiga, até o marco da margem septentrional.

Parágrafo 3º) Do marco septentrional na Lagoa Mandioré continuará em linha recta, no mesmo rumo que hoje, até a latitude 17º 49' e por este parallelo até o meridiano do extremo sudoeste da Lagoa Gahiba. Seguirá esse meridiano até a lagoa e atravessará esta em linha recta até o ponto equidistante dos dois marcos actuaes, na linha antiga de fronteira, e depois por esta linha antiga ou actual até a entrada do canal Pedro Segundo, tambem chamado recentemente Rio Pando.

Parágrafo 4º) Da entrada sul do canal Pedro Segundo ou Rio Pando até a confluencia do Beni e Mamoré os limites serão os mesmos determinados no art. 2º do Tratado de 27 de março de 1867.

Parágrafo 5º) Da confluencia do Beni e do Mamoré descerá a fronteira pelo Rio Madeira até a bocca do Abunan, seu affluente da margem esquerda, e subirá pelo Abunan até a latitude 10º 20'. Dahi irá pelo parallelo de 10º 20', para oeste até o Rio Rapirran e subirá por elle até a sua nascente principal.

Parágrafo 6º) Da nascente principal do Rapirran, irá pelo parallelo da nascente, encontrar a oeste o Rio Iquiry e subirá por este até a sua origem, donde seguirá até o Igarapé Bahia pelos mais pronunciados accidentes do terreno ou por uma linha recta, como aos Commissarios demarcadores dos dois paizes parecer mais conveniente.

Parágrafo 7º) Da nascente do Igarapé Bahia seguirá, descendo por este, até a sua confluencia na margem direita do Rio Acre ou Aquiry e subirá por este até a nascente, se não estiver esta em longitude mais occidental do que a de 69º oeste Greenwich.

A) No caso figurado, isto é, se a nascente do Acre estiver em longitude menos occidental do que a indicada, seguirá fronteira pelo meridiano da nascente até o parallelo de 11º e depois, para oeste por esse parallelo até a fronteira com o Perú.

B) Se o Rio Acre, como parece certo, atravessar a longitude de 69º oeste de Greenwich e correr ora ao norte, ora ao sul do citado parallelo de 11º, acompanhado mais ou menos este, o alveo do rio formará a linha divisoria até á sua nascente, por cujo meridiano continuará até o parallelo de 11º e dahi, na direção de oeste, pelo mesmo parallelo, até a fronteira com o Perú; Mas, se a oeste da citada longitude 69º o Acre correr sempre ao sul do parallelo de 11º, seguirá a fronteira desde esse rio, pela longitude de 69º até o ponto de intersecção com esse parallelo de 11º e depois por elle a fronteira com o Perú.

Artigo II

A transferência de territorios resultante da delimitação descripta no artigo precedente comprehende todos os direitos que lhes são inherentes e a responsabilidade derivada da obrigação de manter e respeitar os direitos reaes adquiridos por nacionaes e estrangeiros segundo os principios do direito civil.

As reclamações provenientes de actos administrativos e de factos ocorridos nos territorios permutados, serão examinados e julgadas por um tribunal arbitral composto de um representante do Brasil, outro da Bolivia e um ministro estrangeiro, acreditado junto ao Governo Brasileiro. Esse terceiro arbitro, presidente do tribunal, será escolhido pelas duas altas partes contractantes logo depois da troca das ratificações do presente Tratado. O tribunal funccionará durante um anno no Rio de Janeiro e começará os seus trabalhos dentro do prazo de seis mezes contados do dia da troca das ratificações. Terá por missão: 1º - Aceitar ou rejeitar as reclamações; 2º - Fixar a importância da indenização; 3º - Designar qual dos dois Governos a deve satisfazer.

O pagamento poderá ser feito em apolices especiaes, ao par, que vençam o juro de tres por cento e tenham a amortização de tres por cento ao anno.

Artigo III

Por não haver equivalencia nas áreas dos territorios permutados entre as duas Nações, os Estados Unidos do Brasil pagarão uma indenização de 2.000.000 (dois milhões de libras esterlinas), que a Republica da Bolivia aceita com o proposito de applicar principalmente na construção de caminhos de ferro ou em outras obras tendentes a melhorar as communicações e desenvolver o commercio entre os dois paizes.

O pagamento será feito em duas prestações de um milhão de libras cada uma; A primeira, dentro do prazo de tres mezes, contado da troca das ratificações do presente Tratado, e a segunda em 31 de março de 1905.

Artigo IV

Uma Commissão Mixta, nomeada pelos dois Governos, dentro do prazo de um anno, contado da troca das ratificações, procederá á demarcação da fronteira descripta no artigo I, começando os seus trabalhos dentro dos seis mezes seguintes á nomeação.

Qualquer desaccordo entre a Comissão Brasileira e a Boliviana, que não puder ser resolvido pelos Governos, será submetido á decisão arbitral de um membro da Royal Geographical Society de Londres, escolhido pelo presidente e membros do conselho da mesma.

Se os Commissarios Demarcadores nomeados por uma das altas partes contractantes deixarem de concorrer ao logar e na data da reunião que forem convencionados para o começo dos trabalhos, os Commissarios da outra procederão por si sós á demarcação, e o resultado das suas operações será obrigatório para ambas.

Artigo V (versa sobre navegação, comercio e alfandega)

Artigo VI

(versa sobre navegação, comercio e alfandega)

Artigo VII

(versa sobre obrigação do Brasil de construir ferrovia)

Artigo VIII

A Republica dos Estados Unidos do Brasil declara que ventilará directamente com a do Perú a questão de fronteira relativa ao território comprehendido entre a nascente do Javary e o parallelo de 11º, procurando chegar a uma solução amigavel do litigio sem responsabilidades para a Bolívia em caso algum.

Artigo IX

Os desaccordos que possam sobrevir entre os dois Governos quanto á interpretação e execução do presente Tratado, serão submetidos a arbitramento.

Artigo X

Este Tratado, depois de aprovado pelo Poder Legislativo de cada uma das duas Repúblicas, será ratificado pelos respectivos Governos e as ratificações serão trocadas na cidade do Rio de Janeiro no mais breve prazo possível.

Em fé do que nós, os Plenipotenciarios acima nomeados, assignamos o presente Tratado, em dois exemplares, cada um nas linguas portugueza e castelhana, appondo nelles os nossos sellos.

Feito na cidade de Petropolis, aos dezessete dias no mez de novembro de mil novecentos e tres.

(As) - (L.S.) Rio Branco

(L.S.) J.F. de Assis Brasil

(L.S.) Fernando E. Guachalla

(L.S.) Claudio Pinilla.