MAR TERRITORIAL, ZONA
ECONÔMICA EXCLUSIVA OU
PLATAFORMA CONTINENTAL ?

Jairo Marcondes de Souza (jairosouza@petrobras.com.br)
PETROBRAS, Brasil

Abstract

The United Nations Convention on the Law of the Sea (UNCLOS) – also known as "The Law of the Sea" – defines the important concepts of territorial sea, exclusive economic zone, and continental shelf. Although these terms apply to distinct regions of the sea, there are lots of misunderstanding and confusion in using the correct name when referring to a particular portion of the ocean. We intend to give the reader some insights about these names and their correct use.

 

INTRODUÇÃO

A Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM) – assinada pelo Brasil em 10 de dezembro de1982 e, posteriormente, ratificada em 22 de dezembro de 1988 – introduz e/ou consagra os conceitos de mar territorial, zona econômica exclusiva e plataforma continental, que, embora distintos e aplicáveis a espaços oceânicos próprios, têm sido freqüentemente confundidos e erroneamente utilizados.

Em 4 de janeiro de 1993, o Governo brasileiro sancionou a Lei nº 8.617, que tornou os limites marítimos brasileiros coerentes com os limites preconizados pela CNUDM.

Mar Territorial

Nos termos da CNUDM (arts. 2 e 3), a soberania do Estado costeiro sobre o seu território e suas águas interiores estende-se a uma faixa de mar adjacente – mar territorial –, com dimensão de até 12 milhas marítimas (m.m.; 1 m.m.= 1.852 metros) a partir das linhas de base.

No mar territorial, o Estado costeiro exerce soberania ou controle pleno sobre a massa líquida e o espaço aéreo sobrejacente, bem como sobre leito e o subsolo deste mar.

O mar territorial brasileiro de 200 m.m. – instituído pelo Decreto-lei nº 1.098, de 25 de março de 1970 – passou a ser de 12 m.m., com a vigência da Lei nº 8.617.

Zona Econômica Exclusiva (ZEE)

"A zona econômica exclusiva é uma zona situada além do mar territorial e a este adjacente..." (CNUDM, art. 55) e "...não se estenderá além de 200 milhas marítimas das linhas de base a partir das quais se mede a largura do mar territorial" (CNUDM, art. 57).

A Convenção garante ao Estado costeiro "...direitos de soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, vivos ou não vivos das águas sobrejacentes ao leito do mar, do leito do mar e seu subsolo..." (CNUDM, art. 56, par. 1, alínea a).

Com o objetivo de promover a utilização ótima dos recursos vivos da ZEE, o Estado costeiro fixará as capturas permissíveis desses recursos. "Quando o Estado costeiro não tiver capacidade para efetuar a totalidade da captura permissível deve dar a outros Estados acesso ao excedente desta captura, mediante acordos ou outros ajustes..." (CNUDM, art. 62, par. 2) entre as partes.

O programa do Governo brasileiro denominado Avaliação do Potencial Sustentável de Recursos Vivos na Zona Econômica Exclusiva (REVIZEE) –, coordenado pela Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM), tem por objetivo identificar os recursos vivos e estabelecer o potencial de sua captura na ZEE brasileira. "O Estado costeiro, tendo em conta os melhores dados científicos de que disponha, assegurará, por meio de medidas apropriadas de conservação e gestão, que a preservação dos recursos vivos de sua zona econômica exclusiva não seja ameaçada por um excesso de captura." (CNUDM, art. 61, par. 2).

Na ZEE, o Estado costeiro tem jurisdição para regulamentar a investigação científica marinha e "...tem o direito exclusivo de construir e de autorizar e regulamentar a construção, operação e utilização de: a) ilhas artificiais; b) instalações e estruturas...." (CNUDM, art. 60, par. 1) com finalidades econômicas e/ou para fins de investigação científica. Qualquer investigação científica na ZEE brasileira – por instituições nacionais e/ou internacionais – somente poderá ser realizada com o consentimento do Governo brasileiro.

Plataforma CONTINENTAL

"A plataforma continental de um Estado costeiro compreende o leito e o subsolo das áreas submarinas que se estendem além do seu mar territorial, em toda a extensão do prolongamento natural do seu território terrestre, até ao bordo exterior da margem continental, ou até uma distância de 200 milhas marítimas das linhas de base a partir das quais se mede a largura do mar territorial, nos casos em que o bordo exterior da margem continental não atinja essa distância." (CNUDM, art. 76, par. 1).

A definição de plataforma continental, consagrada pelo parágrafo 1º do artigo 76 da CNUDM, tem um enfoque jurídico (PCJ) e pouco tem a ver com o conceito fisiográfico ou geomorfológico de plataforma continental (PCG) de Heezen, Tharp e Ewing (1959). Segundo esses autores, a PCG é uma área plana, com relevo muito suave e gradiente sempre inferior a 1:1000. Mundialmente, está limitada a profundidades menores que -460m, com predominância de profundidades inferiores a -185m, razão pela qual comumente se utiliza a isóbata de 200 m como o limite da PCG. A sua largura varia de poucas milhas a mais de 200 milhas marítimas. Sua borda externa – ou "quebra da plataforma" – é marcada quando o gradiente passa, bruscamente, de menos de 1:1000 para maior do que 1:40.

Pela definição jurídica de plataforma continental, vemos que a PCJ de um Estado costeiro pode englobar as feições fisiográficas conhecidas como plataforma, talude e elevação continentais, e, em algumas circunstâncias, inclusive regiões da planície abissal. O conceito de PCJ não se aplica à massa líquida sobrejacente ao leito do mar, mas apenas ao leito e ao subsolo desse mar.

Nos casos em que a PCJ de um Estado costeiro assumir uma extensão de até 200 m.m., o conceito de ZEE é mais abrangente e, implicitamente, engloba o conceito de PCJ. Da definição de PCJ, deduz-se que a extensão mínima da PCJ brasileira será de 200 m.m., e, neste caso, coincidirá com a ZEE brasileira.

Na PCJ, segundo a CNUDM, o Estado costeiro exerce direitos de soberania para fins de exploração e aproveitamento dos seus recursos naturais e esses direitos são exclusivos, ou seja, "...se o Estado costeiro não explora a plataforma continental ou não aproveita os recursos naturais da mesma, ninguém pode empreender estas atividades sem o expresso consentimento desse Estado." (CNUDM, art. 77, par. 2).

Os recursos naturais da PCJ compreendem "...os recursos minerais e outros recursos não vivos do leito do mar e subsolo bem como os organismos vivos pertencentes a espécies sedentárias, isto é, aquelas que no período de captura estão imóveis no leito do mar ou no seu subsolo ou só podem mover-se em constante contato físico com esse leito ou subsolo." (CNUDM, art. 77, par. 4).

Critérios para a Determinação da Plataforma Continental

Nos termos do parágrafo 3º do artigo 76 da CNUDM, "A margem continental compreende o prolongamento submerso da massa terrestre do Estado costeiro e é constituída pelo leito e subsolo da plataforma continental, pelo talude e pela elevação continental. Não compreende nem os grandes fundos oceânicos, com as suas cristas oceânicas, nem o seu subsolo.". A definição jurídica de plataforma continental (PCJ) é um tanto complexa e possibilita distintas interpretações do seu enunciado. Nessa definição (CNUDM, art.76, par. 1), o termo margem continental é empregado no sentido fisiográfico ou geomorfológico (MCG) de Heezen, Tharp & Ewing (1959).

A determinação do limite exterior da PCJ de um Estado costeiro é obtida pela utilização integrada dos critérios de delimitação da margem continental jurídica (MCJ) – conceito implicitamente embutido no parágrafo 4º do artigo 76 da CNUDM – com os critérios de restrição da máxima extensão da PCJ (CNUDM, art. 76, par.5).

Nos termos do parágrafo 4º do artigo 76, o Estado costeiro deve estabelecer o bordo exterior da MCJ, quando a MCG se estender além das 200 m.m., por intermédio de (Fig. 1):

i) uma linha unindo pontos nos quais "...a espessura das rochas sedimentares seja pelo menos 1% da distância mais curta entre esse ponto e o pé do talude continental;" ou

ii) uma linha unindo "...pontos fixos situados a não mais de 60 milhas marítimas do pé do talude continental.".

Verifica-se que o pé do talude continental é a feição de referência dos dois critérios de determinação da MCJ. Ainda de acordo com o parágrafo 4º, esta feição é definida como: "Salvo prova em contrário, o pé do talude continental deve ser determinado como o ponto de variação máxima do gradiente na sua base.".

Uma vez determinado o bordo exterior da MCJ por qualquer dos critérios retromencionados, o parágrafo 5º do artigo 76 estabelece que: "Os pontos fixos que constituem a linha dos limites exteriores da plataforma continental no leito do mar, ..., devem estar situados a uma distância que não exceda 350 milhas marítimas da linha de base a partir da qual se mede a largura do mar territorial ou a uma distância que não exceda 100 milhas marítimas da isóbata de 2500 metros, que é uma linha que une profundidades de 2500 metros." (Figs.1 e 2).

O limite da PCJ além das 200 m.m. será traçado "...unindo, mediante linhas retas, que não excedam 60 milhas marítimas, pontos fixos definidos por coordenadas de latitude e longitude." (CNUDM, art. 76, par. 7).

"...Os limites da pataforma continental estabelecidos pelo Estado costeiro com base nessas recomendações serão definitivos e obrigatórios." (CNUDM, art. 76, par. 8), devendo o Estado costeiro "...depositar junto ao Secretário Geral das Nações Unidas mapas e informações pertinentes, incluindo dados geodésicos, que descrevam permanentemente os limites exteriores da sua plataforma continental. O Secretário Geral deve dar a esses documentos a devida publicidade." (CNUDM, art. 76, par. 9).

O Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira (LEPLAC) é o programa do Governo brasileiro que tem por objetivo determinar o limite da plataforma continental além das 200 m.m., no termos em que a mesma é definida no artigo 76 da CNUDM.

CONCLUSOES

Os trabalhos do LEPLAC, iniciados em 1987, vêm sendo desenvolvidos de forma a possibilitar ao Governo brasileiro apresentar à ONU o limite de sua plataforma continental dentro do prazo de 10 anos iniciados com a entrada em vigor da CNUDM em 16 de novembro de 1994.

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AGRADECIMENTOS

A todos os profissionais da PETROBRAS, da Diretoria de Hidrografia e Navegação (DHN) da Marinha do Brasil, do "Comitê Executivo para o LEPLAC" e do "Grupo de Trabalho Permanente para a Elaboração da Proposta Política do LEPLAC", com os quais o autor teve a oportunidade de aprofundar discussões sobre enfoques consubstanciados neste artigo. É de exclusiva responsabilidade do autor, no entanto, os pontos de vista aqui enfocados.

Neither the Brazilian Government, nor PETROBRAS or people involved in the LEPLAC endorse or have any responsability for the content of this article. The author is the only one responsible for the content and point of views expressed in this article.

 

 

 

Fig. 1 – Critérios para definição da plataforma continental.

Fig. 2 –Definição da plataforma continental de um Estado costeiro.